sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Cotas nos concursos públicos do Rio Grande do Sul


A Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul aprovou na terça-feira (27) a reserva de 15% das vagas em concursos públicos para negros, pardos e indígenas. Se a lei for sancionada, as cotas valerão para todos os concursos da administração pública direta e indireta de todos os poderes do Estado.
O projeto de lei, de autoria do deputado Raul Carrion (PCdoB), recebeu 47 votos favoráveis e nenhum contrário. A proposta tramitava no Parlamento desde 2007 e já havia sido aprovada e debatida nas comissões de Constituição e Justiça e de Cidadania e Diretos Humanos.
A proposta original previa a reserva de 13% das vagas para a ação afirmativa, mas o percentual foi ampliado para 15%. O índice é correspondente ao total da população atingida no estado, de acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A lei ainda depende de sanção do governador Tarso Genro e entra em vigor assim que for publicada no Diário Oficial do Estado (Fonte: G1)

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Teori Zavaschi e a superexposição do STF


Teori Zavaschi chega ao STF nesta quinta (29) com o nariz torcido para as lentes da TV Justiça. Por ele, os refletores do plenário seriam apagados. “Eu posso estar enganado, mas o excesso de exposição não colabora. Não sou contrário à publicidade dos atos do Judiciário. Eles são públicos até por imposição constitucional. Mas entre a publicidade e a exposição há um meio do caminho.”

O novo ministro parece recear os efeitos da superexposição, potencializada pelo mensalão, sobre o juízo das togas. “O papel do juiz é fazer juízo sobre a legitimidade em face de normas. É complicado avaliar que o juiz possa saber qual a opinião do povo. Se fossemos julgar pela vontade popular não teríamos como aplicar muitas leis, inclusive, em matéria penal.”

Se dependesse do povo, realçou Teori, haveria pena de morte no Brasil. Prefere grudar os olhos nos autos. “O juiz, às vezes, tem que tomar decisões impopulares. Quem tem que aferir a vontade do povo é quem faz as leis”, disse. Parece mais afeito aos autos do que aos microfones. “Eu prefiro dar publicidade aos meus atos do que às minhas palavras.” (...) 
Fonte: Blog do Josias - uol

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Efetividade e penhora de 30% do salário do devedor

Artigo muito interessante e oportuno publicado hoje pela minha amiga e ex-colega de faculdade, advogada Caroline Ledesma Al-Alam, no jornal Diário Popular.
Vale a pena a leitura! 


sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Planos de Saúde e o STJ


STJ PLANO DE SAÚDE COLETIVO. MANUTENÇÃO APÓS APOSENTADORIA. O trabalhador que participou de plano de saúde coletivo, decorrente do vínculo empregatício, por mais de dez anos tem direito à manutenção do benefício com a mesma cobertura, sem nenhuma carência, desde que assuma o pagamento integral da contribuição à operadora do plano de saúde. No caso, o trabalhador aposentou-se em 1994, mas continuou como beneficiário do plano de saúde coletivo custeado pela empregadora, por liberalidade desta, por mais cinco anos após a aposentadoria. Assim, o trabalhador aposentado ainda era beneficiário de plano de saúde coletivo mantido em razão de vínculo empregatício quando do início da vigência da Lei n. 9.656/1998, o que atraiu a aplicação do disposto no art. 31 dessa lei, segundo o qual o aposentado tem direito à manutenção do benefício nas mesmas condições dos beneficiários da ativa. De acordo com a jurisprudência do STJ, o disposto no art. 31 da Lei n. 9.656/1998 é autoaplicável, ou seja, contém todos os elementos necessários ao exercício dos direitos que assegura. Dessa forma, a Res. n. 21/1999 do Conselho de Saúde Suplementar – CONSU, que limitou a aplicação do disposto no art. 31 a aposentadorias ocorridas após 2 de janeiro de 1.999, extrapolou o poder regulamentar e fez restrição não existente na mencionada lei. Quanto à aplicabilidade da norma no tempo, o Min. Relator afirmou ser certo que a Lei n. 9.656/1998 aplica-se a fatos ocorridos a partir de sua vigência, mas o diploma deve atingir também as relações de trato sucessivo, mesmo que constituídas anteriormente, tal como no caso examinado. Ademais, o art. 31 determina que o beneficiário deve assumir integralmente a mensalidade do plano de saúde, o que não gera desequilíbrio econômico-financeiro do contrato da apólice coletiva. Precedentes citados: REsp 650.400-SP, DJe de 5/8/2010; REsp 925.313-DF, DJe 26/3/2012; REsp 1.078.991-DF, DJe de 16/6/2009, e REsp 820.379-DF, DJ 6/8/2007. REsp 531.370-SP, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 7/8/2012 Inf501 3ª Turma

STJ CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. NEGATIVA INJUSTA DE COBERTURA SECURITÁRIA MÉDICA. CABIMENTO. 1. Afigura-se a ocorrência de dano moral na hipótese de a parte, já internada e prestes a ser operada - naturalmente abalada pela notícia de que estava acometida de câncer -, ser surpreendida pela notícia de que a prótese a ser utilizada na cirurgia não seria custeada pelo plano de saúde no qual depositava confiança há quase 20 anos, sendo obrigada a emitir cheque desprovido de fundos para garantir a realização da intervenção médica. A toda a carga emocional que antecede uma operação somou-se a angústia decorrente não apenas da incerteza quanto à própria realização da cirurgia mas também acerca dos seus desdobramentos, em especial a alta hospitalar, sua recuperação e a continuidade do tratamento, tudo em virtude de uma negativa de cobertura que, ao final, se demonstrou injustificada, ilegal e abusiva. 2. Conquanto geralmente nos contratos o mero inadimplemento não seja causa para ocorrência de danos morais, a jurisprudência do STJ vem reconhecendo o direito ao ressarcimento dos danos morais advindos da injusta recusa de cobertura securitária médica, na medida em que a conduta agrava a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado, o qual, ao pedir a autorização da seguradora, já se encontra em condição de dor, de abalo psicológico e com a saúde debilitada. 3. Recurso especial provido. (REsp 1190880/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/05/2011, DJe 20/06/2011)

STJ DIREITO CIVIL. CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CLÁUSULA DE REAJUSTE POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. INCREMENTO DO RISCO SUBJETIVO. SEGURADO IDOSO. DISCRIMINAÇÃO. ABUSO A SER AFERIDO CASO A CASO. CONDIÇÕES QUE DEVEM SER OBSERVADAS PARA VALIDADE DO REAJUSTE. 1. Nos contratos de seguro de saúde, de trato sucessivo, os valores cobrados a título de prêmio ou mensalidade guardam relação de proporcionalidade com o grau de probabilidade de ocorrência do evento risco coberto. Maior o risco, maior o valor do prêmio. 2. É de natural constatação que quanto mais avançada a idade da pessoa, independentemente de estar ou não ela enquadrada legalmente como idosa, maior é a probabilidade de contrair problema que afete sua saúde. Há uma relação direta entre incremento de faixa etária e aumento de risco de a pessoa vir a necessitar de serviços de assistência médica. 3. Atento a tal circunstância, veio o legislador a editar a Lei Federal nº 9.656/98, rompendo o silêncio que até então mantinha acerca do tema, preservando a possibilidade de reajuste da mensalidade de plano ou seguro de saúde em razão da mudança de faixa etária do segurado, estabelecendo, contudo, algumas restrições e limites a tais reajustes. 4. Não se deve ignorar que o Estatuto do Idoso, em seu art. 15, § 3º, veda "a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade". Entretanto, a incidência de tal preceito não autoriza uma interpretação literal que determine, abstratamente, que se repute abusivo todo e qualquer reajuste baseado em mudança de faixa etária do idoso. Somente o reajuste desarrazoado, injustificado, que, em concreto, vise de forma perceptível a dificultar ou impedir a permanência do segurado idoso no plano de saúde implica na vedada discriminação, violadora da garantia da isonomia. 5. Nesse contexto, deve-se admitir a validade de reajustes em razão da mudança de faixa etária, desde que atendidas certas condições, quais sejam: a) previsão no instrumento negocial; b) respeito aos limites e demais requisitos estabelecidos na Lei Federal nº 9.656/98; e c) observância ao princípio da boa-fé objetiva, que veda índices de reajuste desarrazoados ou aleatórios, que onerem em demasia o segurado. 6. Sempre que o consumidor segurado perceber abuso no aumento de mensalidade de seu seguro de saúde, em razão de mudança de faixa etária, poderá questionar a validade de tal medida, cabendo ao Judiciário o exame da exorbitância, caso a caso. 7. Recurso especial provido. (REsp 866840/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 07/06/2011, DJe 17/08/2011)

terça-feira, 13 de novembro de 2012

"Deus seja louvado"

MPF em SP pede retirada da frase 'Deus seja louvado' das notas de reais


   A Procuradoria da República no Estado de São Paulo pediu à Justiça Federal que determine a retirada da expressão “Deus seja louvado” das cédulas de reais.
   A ação pede, em caráter liminar, que seja concedido à União o prazo de 120 dias para que as cédulas comecem a ser impressas sem a frase, anunciou nesta segunda-feira (12) a procuradoria. Dessa forma, a medida não gerará gastos aos cofres públicos, diz o Ministério Público Federal em São Paulo.
   “O Estado brasileiro é laico e, portanto, deve estar completamente desvinculado de qualquer manifestação religiosa”, cita a procuradoria, como um dos principais argumentos da ação.
   Uma das teses da ação é que a frase “Deus seja louvado” privilegia uma religião em detrimento das outras. Como argumento, o texto cita princípios como o da igualdade e o da não exclusão das minorias.
   O procurador regional dos Direitos do Cidadão, Jefferson Aparecido Dias, reconhece que a maioria da população segue religiões de origem cristã (católicos e evangélicos), mas lembra que o país é um Estado laico. “Imaginemos a cédula de real com as seguintes expressões: 'Alá seja louvado', 'Buda seja louvado', 'Salve Oxossi', 'Salve Lord Ganesha', 'Deus Não existe'”, argumenta.
   A ação também pede à Justiça Federal que estipule multa diária de R$ 1,00 caso a União não cumpra a decisão. A multa teria caráter simbólico, “apenas para servir como uma espécie de contador do desrespeito que poderá ser demonstrado pela ré, não só pela decisão judicial, mas também pelas pessoas por ela beneficiadas”.


   Representação
   A procuradoria disse que recebeu, em 2011, uma representação questionando a frase nas notas. No inquérito, a Casa da Moeda informou ao órgão que cabe ao Banco Central a emissão e a “definição das características técnicas e artísticas das cédulas”.
   A inclusão da expressão nas cédulas aconteceu em 1986, por determinação do então presidente José Sarney, de acordo com informações do Ministério da Fazenda passadas à procuradoria. Em 1994, com o Plano Real, a frase foi mantida pelo ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, supostamente por ser “tradição da cédula brasileira”, apesar de ter sido inserida há poucos anos, diz.
   Ainda segundo a procuradoria, para o BC o fundamento legal para a existência da frase nas cédulas é o preâmbulo da Constituição, que afirma que ela foi promulgada “sob a proteção de Deus”.
   O procurador Dias lembra, em nota, que não existe lei autorizando a inclusão da expressão religiosa nas cédulas brasileiras. (Fonte: G1)

"Vamos acompanhar..."

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A institucionalização da tortura no Brasil

Vídeo sugere que ditadura ensinou indígenas a torturar:

   Para se livrar de pressões externas e não ter os planos de expansão do interior alterados, a ditadura criou na década de 70 a Guarda Rural Indígena (Grin), informa a repórter especial da Folha Laura Capriglione.
   Segundo a portaria que criou a guarda, no ano de 1969, a tropa teria a missão de "executar o policiamento ostensivo das áreas reservadas aos silvícolas".
   A formatura da primeira turma da guarda era composta por 84 índios recrutados em aldeias xerente, maxacali, carajá, krahô e gaviões que aparecem em cenas gravadas há 42 anos e reveladas pelo pesquisador Marcelo Zelic, 49, vice-presidente do Grupo Tortura Nunca Mais/SP e membro da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo.
   As imagens foram encontradas no Museu do Índio, no Rio de Janeiro, em um DVD com o título "Arara", fruto da digitalização de 20 rolos de filme 16 mm, sem áudio.
   A etiqueta levava a crer que se tratava de material sobre a etnia arara --índios conhecidos nas cercanias de Altamira (PA) desde 1850. Mas, em vez do "povo das araras vermelhas", como se denominam até hoje seus 361 remanescentes (dados de 2012), era outra "arara" que nomeava a caixa.
   Tratava-se de pau de arara, a autêntica contribuição brasileira ao arsenal mundial de técnicas de tortura, usado desde os tempos da colônia para punir "negros fujões", como se dizia. Por lembrar as longas varas usadas para levar aves aos mercados, atadas pelos pés, o suplício ganhou esse nome.
   Na ditadura militar (1964-85), porém, o pau de arara só aparecia sob a forma de denúncia, estampando jornais alternativos, em filmes e documentários realizados por militantes oposicionistas.
   Entranhada nos porões, a tortura jamais recebera tratamento tão alegre e solto quanto naqueles 26 minutos e 55 segundos, que exibem o pau de arara orgulhosamente à luz do dia, em ato oficial, sob os aplausos das autoridades e de uma multidão de basbaques.
   Fotógrafos e cinegrafistas cobriram o evento, mas a cena, que assusta pela impudência, ficou de fora dos jornais e das revistas. Sobrou, ao que se saiba, apenas camuflada sob o título inocente.
   O filme é parte do acervo sobre 60 povos indígenas, coletado durante quatro décadas pelo documentarista Jesco von Puttkamer (1919-94) e doado em 1977 ao IGPA (Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia), da Pontifícia Universidade Católica de Goiás. 
(Fonte: Folha.com)

Teoria do domínio do fato é usada de forma errada


Estudioso da teoria do domínio fato, usada pelos ministros do Supremo Tribunal Federal para condenar boa parte dos réus da Ação Penal 470, o processo do mensalão, o jurista alemão Claus Roxin, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, publicada neste domingo (11/11), discordou da intepretação dada ao trabalho.
Roxin, que aprimorou a teoria, corrige a noção de que só o cargo serve para indicar a autoria do crime e condena julgamento sob publicidade opressiva, como está acontecendo no Brasil.
"Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado", diz Roxin.
Leia a entrevista:
Folha — O que o levou ao estudo da teoria do domínio do fato?
Claus Roxin — O que me perturbava eram os crimes do nacional socialismo. Achava que quem ocupa posição dentro de um chamado aparato organizado de poder e dá o comando para que se execute um delito tem de responder como autor e não só como partícipe, como queria a doutrina da época. Na época, a jurisprudência alemã ignorou minha teoria. Mas conseguimos alguns êxitos. Na Argentina, o processo contra a junta militar de Videla [Jorge Rafael Videla, presidente da Junta Militar que governou o país de 1976 a 1981] aplicou a teoria, considerando culpados os comandantes da junta pelo desaparecimento de pessoas. Está no estatuto do Tribunal Penal Internacional e no equivalente ao STJ alemão, que a adotou para julgar crimes na Alemanha Oriental. A Corte Suprema do Peru também usou a teoria para julgar Fujimori [presidente entre 1990 e 2000].

Folha — É possível usar a teoria para fundamentar a condenação de um acusado supondo sua participação apenas pelo fato de sua posição hierárquica?
Roxin — Não, em absoluto. A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem. Isso seria um mau uso.

Folha — O dever de conhecer os atos de um subordinado não implica em corresponsabilidade?
Roxin — A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção ["dever de saber"] é do direito anglo-saxão e não a considero correta. No caso do Fujimori, por exemplo, foi importante ter provas de que ele controlou os sequestros e homicídios realizados.

Folha — A opinião pública pede punições severas no mensalão. A pressão da opinião pública pode influenciar o juiz?
Roxin — Na Alemanha, temos o mesmo problema. É interessante saber que aqui também há o clamor por condenações severas, mesmo sem provas suficientes. O problema é que isso não corresponde ao direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública.
Fonte: Conjur
Indicação da leitora Nathalie Grequi Cardoso

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

A teoria das janelas quebradas

Artigo publicado no Jornal Diário Popular de 08/11/2012 (hoje) pelo Delegado de Polícia Civil do Rio Grande do Sul, Roger Brutti, reproduzindo texto anterior que ele já havia publicado:


Sobre o mesmo assunto, texto publicado Arthur Lucas no blog "Pensar não dói":

Tolerância Zero e a Teoria das Janelas Quebradas:
Revoltados contra os abusos e crimes cruéis cometidos contra as pessoas ou contra o patrimônio, volta e meia alguns propõem que seja adotada uma Política de Tolerância Zero Contra o Crime. Prestando atenção ao discurso subjacente entre a maioria das manifestações deste tipo, porém, percebe-se uma grande incompreensão média acerca do que seja tal política, e em muitos casos identifica-se apenas uma vaga intenção de combater a violência com ainda maior violência, chegando ao ponto de defenderem ações truculentas francamente ilegais e mesmo criminosas por parte da população e dos agentes do Estado, revelando um espírito tão ou mais belicoso, anti-social e pernicioso que o daqueles a quem supostamente desejam combater.

Este artigo vem esclarecer o que é e o que não é uma Política de Tolerância Zero Contra o Crime, quais seus fundamentos históricos e teóricos, quais as ações que caracterizam uma aplicação coerente de tal filosofia e que benefícios se pode esperar desta aplicação.

O que a Política de Tolerância Zero não é:
A Política de Tolerância Zero Contra o Crime não é uma política de tapar o sol com a peneira em relação aos ilícitos cometidos pelas polícias durante o combate ao crime. Muito antes pelo contrário, é pressuposto de sua implantação a estrita legalidade dos atos policiais e o absoluto respeito ao Estado Democrático de Direito.

A Política de Tolerância Zero Contra o Crime não é uma proposta de tornar a polícia mais audaz, agressiva ou invasiva. Muito antes pelo contrário, é pressuposto de sua implantação a valorização do agente policial como representante de um Estado pacífico e mantenedor da ordem e da harmonia social em benefício de todos os seus cidadãos.

A Política de Tolerância Zero Contra o Crime não é baseada em qualquer forma de violência. Muito antes pelo contrário, é pressuposto de sua implantação que haja um grande desejo social de repelir a violência em todas as suas formas e manifestações, reconhecendo que não é possível mascarar a truculência nos calabouços do Estado com qualquer tipo de cosmética social.

Para deixar bem claro, a Política de Tolerância Zero Contra o Crime não é sequer uma política de enfrentamento direto do crime.

Bem, então o que é a Política de Tolerância Zero?
A Política de Tolerância Zero é uma estratégia indireta de combate ao crime, baseada na Teoria das Janelas Quebradas. É uma estratégia de manutenção da ordem pública, da segurança dos espaços de convivência social e da adequada prevenção de fatores criminógenos.

A Política de Tolerância Zero Contra o Crime inicia pela tomada de consciência do Estado da necessidade de primeiro cumprir seus deveres legais para com a população, oferecendo-lhe condições adequadas de desenvolvimento psicossocial e acesso aos serviçoes do Estado, depurando suas fileiras da corrupção e da venalidade, reconquistando a confiança da população e estabelecendo com ela a aliança que desde sempre deveria haver entre o Estado e seus cidadãos.

E o que é a Teoria das Janelas Quebradas?
A Teoria das Janelas Quebradas é o fundamento psicossociológico que estabelece uma ligação entre o grau de manutenção de ordem social e a vulnerabilidade do sistema social a uma escalada criminal.

O nome “Teoria das Janelas Quebradas” trata-se da alcunha com que ficou conhecido um estudo publicado em 1982 pelo cientista político James Q. Wilson e o psicólogo criminologista George Kelling na revista Atlantic Monthly, intitulado “The Police and Neiborghood Safety” (A Polícia e a Segurança da Comunidade). O estudo usava a imagem de janelas quebradas e não consertadas para explicar a lógica de decadência social que levava à infiltração da criminalidade em um ambiente até então saudável.

Descrição da Teoria das Janelas Quebradas
Imagine um bairro residencial de classe média, com casas com gramados bem cuidados, ruas limpas, ajardinadas e bem iluminadas. Este é um ambiente onde há percepção de ordem e sensação de segurança. Os imóveis residenciais e comerciais são valorizados, e o bairro é considerado um bom local para morar ou para instalar uma pequena atividade comercial, como uma loja, uma padaria ou o escritório de um profissional liberal.

Imagine agora que alguém jogue uma pedra na janela de uma casa e a quebre. Duas coisas podem acontecer:

1) Se o vidro quebrado for logo substituído, nenhum indício de desordem social permanece. O ambiente permanece saudável, e nenhum estímulo à desordem se insinua. Isso não quer dizer que o nível de desordem seja nulo, mas que existe investimento na manutenção de um ambiente saudável. Provavelmente existe também vigilância contra a desordem. A mensagem transmitida é: nós cuidamos do ambiente onde vivemos.

2) Se o vidro quebrado não for substituído, um indício claro de desordem social permanece. O ambiente foi violado e ninguém corrigiu o problema, e o estímulo à desordem surge. Isso não quer dizer que não existe interesse na ordem, mas que não há investimento nem esforço para manter o ambiente saudável. Provavelmente também não existe vigilância contra a desordem. A mensagem transmitida é: este ambiente é vulnerável.

Ora, se um ambiente passa a mensagem de ser bem cuidado e o outro de ser vulnerável, onde há de ocorrer preferencialmente a próxima ação desordeira?

Conseqüências da Teoria das Janelas Quebradas:
Uma janela quebrada não foi substituída. O sinal de vulnerabilidade à desordem foi dado. O próximo passo é um teste: outras janelas serão quebradas para ver se ninguém toma uma providência. Logo o prédio inicialmente atingido se encontrará com a maioria das janelas quebradas, e o sinal se tornará claro a todos que passarem em frente daquele prédio: este ambiente está se degradando, está se degenerando, está vulnerável.

As conseqüências são bastante impactantes: os imóveis começam a se desvalorizar. Casas são colocada à venda, tentando ainda pegar um bom preço pelo imóvel, e algumas ficam longos períodos sem ocupação. Novas janelas são quebradas e não são substituídas, e gramados deixam de ser aparados, indicando abandono do local. Eventualmente um imóvel é invadido, e o invasor obviamente não cuida do que não é seu. O ambiente começa a ficar com um aspecto sujo, cada vez pior.

Famílias e pessoas ordeiras começam a se mudar daquele ambiente, e desocupados e desordeiros começam a se mudar para aquele ambiente. Os comerciantes começam a ter menos lucro e cessam suas atividades ou tentam passar o ponto. Comércio de boa qualidade sai e entra comércio de quinquilharias e bares de quinta categoria. Uma boca-de-fumo se instala. O índice de furtos sobe nas imediações.

O Poder Público deixa de substituir luminárias quebradas. O lixo começa a se acumular nas ruas e o pavimento não é mais recuperado com a mesma freqüência do pavimento em outros bairros. Eventualmente uma via é bloqueada para reduzir o acesso da polícia ao local. Água e luz passam a ser ligadas clandestinamente. O local passa a ser conhecido como “barra-pesada”.

Todo um ciclo de desordem levando a mais desordem se estabelece, em uma espiral de degradação e degeneração do sistema social. No princípio ocorre uma substituição de moradores, mas em seguida o ambiente degenerado passa a produzir crianças que nascem e crescem nestas condições. A situação se agrava continuamente e nunca se resolve sozinha.

Como recuperar um ambiente assim degradado?
É neste ponto que se insere a chamada Política de Tolerância Zero, que recupera em primeiro lugar a ação do Estado sobre o Estado, depois a ação do Estado sobre o ambiente, e finalmente reconquista a colaboração da população para a proteção do ambiente comum.

O melhor modo de ilustrar estes três tipo de ações é apresentar o exemplo mais conhecido, iniciado na cidade de New York quando Rudolph Giuliani ainda não era prefeito. O prefeito de NY na ocasião era David Dinkins, e Rudolph Giuliani seria seu sucessor.

A situação em NY era crítica: os sem-teto ocupavam espaços públicos como praças, parques e o metrô, faziam suas necessidades fisiológicas nas calçadas e mendigavam agressivamente, eventualmente até com ameaças; pichações tomavam conta da paisagem urbana; gangues de desordeiros proliferavam livremente e tomavam conta de territórios.

O ponto de estrangulamento do sistema era o metrô, necessário para o transporte de três milhões de pessoas por dia e tornado um ambiente imundo, incivilizado e perigoso, dominado por gangues, onde ocorriam assaltos e tráfico de drogas.

Kelling, um dos autores do estudo anteriormente citado, e William Bratton, um policial de brilhante carreira em Boston, foram contratados para estudar e resolver o problema.

A maior dificuldade, e a primeira que teve que ser resolvida, foi convencer os policiais de que algo deveria ser feito, e que este algo não era combater o crime com mais violência, nem promover ações isoladas tais como grandes investigações para desbaratar quadrilhas, e muito menos propor aumento de penas e tratamento mais rigoroso para os infratores, mas simplesmente recuperar a polícia por dentro e torná-la novamente uma instituição promotora de segurança e harmonia social. Somente após vencida esta dificuldade é que foi possível aplicar a Teoria das Janelas Quebradas em NY.

Consertando a primeira Janela Quebrada em NY
O prejuízo para a cidade de NY apenas em passagens de metrô não pagas estava calculado na ordem de US$ 80,000,000.00 anuais. Bratton decidiu atacar em primeiro lugar esta janela quebrada, e passou a colocar policiais à paisana junto às catracas no metrô. Quando um grupo pulava as catracas sem pagar, a qualquer hora do dia ou da noite, todos recebiam imediatamente voz de prisão, eram conduzidos à delegacia, identificados, revistados, fichados, intimados a retornar para depor e então liberados, a menos que alguém já estivesse sendo procurado, o que se verificou ser o caso em muitas ocasiões.

Saltar a catraca sem pagamento não era motivo suficiente para manter alguém detido, mas desobedecer à intimação para depor sim. Portanto, caso alguém não cumprisse a ordem para prestar depoimento, em uma segunda detenção poderia já permanecer preso.

A população que ainda pagava as passagens começou a aplaudir quando acontecia cada um destes episódios de detenção em massa. Começou a haver a percepção de que estava valendo a pena agir dentro da lei, afinal a polícia estava agindo de acordo com a lei e garantindo o cumprimento da lei. Sem que tenha havido aumento da violência, o número de pessoas que passavam sem pagar diminuiu rápida e drasticamente.

Interessantemente, e de acordo com a Teoria das Janelas Quebradas, uma quantidade significativa dos detidos por pular catracas estava portando armas e drogas, ou estava sendo procurado por crimes anteriores.

Em pouco tempo ficou claro que estavam circulando menos armas ilegais e menos drogas, ocorrendo menos assaltos e menos homicídios, e tudo isso em função de haver uma nova visão no comando da polícia, focando suas energias mais em promover o cumprimento da lei do que em combater o crime após sua ocorrência.

Os resultados e a ampliação do programa
O sucesso desta primeira iniciativa fundamentada na Teoria das Janelas Quebradas levou à recuperação do metrô de NY para os cidadãos e fez com que Rudolph Giuliani, eleito em 1993, nomeasse Bratton para a chefia do Departamento de Polícia.

Bratton mantinha a convicção de que o policial deve ser um exemplo para a comunidade e trabalhar em parceria e colaboração com a população. Ele reestruturou o Departamento de Polícia de NY: policiais corruptos perderam seus empregos e foram presos, criando a possibilidade de ampliar a aplicação do programa anti-janelas quebradas a toda a cidade.

A primeira janela quebrada a ser consertada neste novo momento foi a eliminação da extorsão de motoristas nas sinaleiras por infratores que exigiam dinheiro após limparem os pára-brisas dos automóveis sem serem solicitados nem autorizados a fazê-lo. Novamente eram expedidas intimações para depor que, se não cumpridas, resultavam em prisões no caso de uma segunda detenção. A certeza da punição eliminou em poucas semanas um problema que perdurava há anos.

A manutenção da lei, da ordem e da harmonia provou ser responsável pela identificação de criminosos procurados e pela evitação de muitos outros crimes: um indivíduo foi preso por urinar em um parque e no interrogatório revelou a localização de um esconderijo de armas ilegais; um motoqueiro detido por estar sem capacete portava armas; um camelô detido com mercadoria suspeita revelou o paradeiro de um receptador.

A experiência em NY demonstrou que em inúmeros casos o indivíduo que não se importa de cometer um pequeno ilícito pode estar ligado a ilícitos bem maiores. E, nos casos em que não está ligado a ilícitos maiores, a alta chance de ser pego e de ter que responder por um pequeno ilícito (mesmo que tenha apenas que prestar um simples depoimento) é bastante eficaz na prevenção de novos delitos. Mas, mais importante que tudo, mostrou que se o Estado cumprir sua parte, cumprir a lei e fazer cumpri-la, receberá o apoio da população para manter a legalidade.

Conclusão:
São três os pressupostos básicos da Teoria das Janelas Quebradas e da conseqüente aplicação de uma Política de Tolerância Zero:

1) Reformulação da estrutura e do funcionamento das instituições do Estado, tornando-as modelares para a prestação dos serviços a que se destinam, ou seja, aplicação do princípio da Tolerância Zero em primeiro lugar às instituições do Estado.

2) Atuação das instituições e dos agentes do Estado rigorosamente dentro da lei e focados nas necessidades reais das comunidades, promovendo benefícios ao invés de apenas procurar punir o mal já ocorrido.

3) Reconquista da confiança da população através de resultados visíveis e significativos, promovendo maior interação e a formação de parcerias entre o Estado e seus cidadãos.

Embora existam críticas à aplicação da Teoria das Janelas Quebradas e da Política de Tolerância Zero em função de este tipo de ação recair principalmente sobre populações pobres e minorias raciais, é fato que seu verdadeiro foco não são grupos específicos, mas condutas específicas, e que a radicalidade da aplicação do primeiro preceito – a aplicação do princípio de Tolerância Zero em primeiro lugar em relação às instituições do Estado – promove condições não apenas para o combate à corrupção e à criminalidade mas também para o desenvolvimento de instituições mais sadias e com melhores condições de prestar os serviços que devem à população.

As instituições policiais em especial se vêem obrigadas a assumir um novo paradigma, de trabalhar em conjunto com a população para promover a ordem, tendo os agentes policiais a obrigação de comportarem-se como cidadãos-modelo. Não é um mau negócio para ninguém, e não é pedir demais: aqueles que não se considerarem em condições de agir de modo exemplar não deveriam mesmo ser agentes do Estado.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Inversão do ônus da prova no Direito do Consumidor


RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE POR VÍCIO NO PRODUTO (ART. 18 DO CDC). ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO 'OPE JUDICIS' (ART. 6º, VIII, DO CDC). MOMENTO DA INVERSÃO. PREFERENCIALMENTE NA FASE DE SANEAMENTO DO PROCESSO.
 A inversão do ônus da prova pode decorrer da lei ('ope legis'), como na responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço (arts. 12 e 14 do CDC), ou por determinação judicial ('ope judicis'), como no caso dos autos, versando acerca da responsabilidade por vício no produto (art. 18 do CDC).Inteligência das regras dos arts. 12, § 3º, II, e 14, § 3º, I, e. 6º, VIII, do CDC.
 A distribuição do ônus da prova, além de constituir regra de julgamento dirigida ao juiz (aspecto objetivo), apresenta-se também como norma de conduta para as partes, pautando, conforme o ônus atribuído a cada uma delas, o seu comportamento processual (aspecto subjetivo). Doutrina.
 Se o modo como distribuído o ônus da prova influi no comportamento processual das partes (aspecto subjetivo), não pode a a inversão 'ope judicis' ocorrer quando do julgamento da causa pelo juiz (sentença) ou pelo tribunal (acórdão). Previsão nesse sentido do art. 262, §1º, do Projeto de Código de Processo Civil.
 A inversão 'ope judicis' do ônus probatório deve ocorrer preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurando-se à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo, a reabertura de oportunidade para apresentação de provas.
Divergência jurisprudencial entre a Terceira e a Quarta Turma desta Corte. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (REsp 802832/MG, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/04/2011, DJe 21/09/2011)